Com nomes como Sergio Rial, a chapa proposta pela Marfrig quer deixar os conflitos que fizeram história no conselho da BRF no passado. A ideia é agregar ex-CEOs, com experiência em áreas como agronegócio, varejo, marketing e comércio exterior, para que a dona da Sadia se fortaleça.
A lista enviada pela Marfrig terá Molina na cabeça de chapa, como presidente do conselho de administração da BRF. Rial, que deixou o cargo de CEO do Santander Brasil recentemente mas segue como chairman do banco, será o vice-presidente. Sem as funções executivas no Santander, Rial vem ampliando sua participação em conselhos – ele também foi indicado para a Vibra.
A presença de um nome como Rial no próximo board da BRF dá uma ideia do que a Marfrig está imaginando para a dona da Sadia. O executivo foi o grande responsável por mudar a cabeça de Molina. Quando Rial deixou as finanças globais da Cargill e assumiu o comando da companhia fundada por Molina, a Marfrig convivia com um endividamento excessivo – muitos achavam que o negócio não resistiria. Numa estratégia de saneamento financeiro, Sergio Rial vendeu ativos e incutiu em Molina a percepção de que um negócio de commodities só pode funcionar com dívida baixa.
Quando Rial deixou a Marfrig e foi para o Santander, em 2015, o legado ficou. Nos últimos anos, a firma de Marcos Molina desalavancou ao mesmo tempo em que aproveitou a bonança nos EUA – onde é dona da National Beef -, gerando caixa para aquisições (foram R$ 8 bilhões investidos em ações da BRF) ao mesmo tempo em que quitou dívidas e remunerou os acionistas.
Dentro da BRF, todos sempre souberam – inclusive no atual conselho – o que a Marfrig pensava sobre a alavancagem da dona da Sadia. A visão, compartilhada por analistas, é que o negócio sofria com um endividamento muito alto, e a alta dos juros acabaria dificultando ainda mais as chances de uma retomada do pagamento de dividendos. Além disso, sem dinheiro, a BRF ficaria em posição ruim para competir com a Seara, que tem muita bala na agulha para investir.
Nesse cenário, a Marfrig aderiu ao aumento de capital e só não comprou mais ações da BRF em resposta à atuação da Petros. Para evitar o que poderia se transformar numa arbitragem e não passar a ideia de que tentaria burlar o estatuto para aumentar a posição sem disparar a poison pill, a Marfrig apenas acompanhou o follow-on, mantendo a sua posição de cerca de 33% na companhia.
Além de Rial, a composição do próximo board da BRF terá Márcia Marçal dos Santos, esposa de Molina. A empresária faz parte do conselho de administração da Marfrig, já atuou na área de auditoria e divide o controle da MMS, a holding que controla a companhia fundada pelo marido.
Do atual conselho da BRF, somente duas pessoas deverão continuar. Augusto Cruz, que é ex-CEO do Pão de Açúcar (GPA), está na chapa, assim como a atual presidente da Adidas, Flávia Bittencourt. Os dois já compõem o colegiado da dona da Sadia – Cruz vai para o terceiro mandato no board.
A Marfrig também está indicando Altamir Batista da Silva, um banqueiro que trabalhou por anos no J.P. Morgan e no Safra. Oscar Bernardes, um executivo que conhece profundamente o agronegócio por ter liderado a Bunge Internacional e ser membro do conselho da companhia de fertilizantes Mosaic, também fará parte do conselho da BRF. Atualmente, Bernardes também faz parte dos conselhos de Localiza, Dasa, Votorantim Participações e da usina Jalles Machado.
Numa empresa que ainda sofre com o embargo da União Europeia, a experiência em comércio exterior e negociações comerciais na OMC também pode ajudar. Não à toa, a Marfrig também indicou para ser conselheiro Pedro de Camargo Neto, que esteve por trás da vitória brasileira no contencioso do algodão quando era secretário do Ministério da Agricultura. Camargo Neto é pecuarista e comandou a antiga Abipecs, associação de exportadores de carne suína – um produto fundamental para Sadia e Perdigão.
Com experiência em gestão, relações internacionais e ESG, Deborah Vieitas é outro indicada. A executiva é CEO da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham), faz parte do conselho do Santander e já foi diretora de bancos como o BNP Paribas. O décimo nome é Eduardo Pocetti, que é do conselho fiscal da Marfrig e do board da Metal Leve.
A chapa proposta pela Marfrig já foi endossada pela BRF, que vai enviar os nomes como a proposta da administração para a assembleia de 28 de março. No board da BRF, a chapa foi aprovada com nove votos. Um conselheiro se absteve.
Considerando a massiva aprovação do follow-on na última assembleia da BRF, a tendência é que a chapa seja aprovada. Uma eventual alteração em parte dos nomes poderia ocorrer se os fundos de pensão tentarem o voto múltiplo, o que ainda não está claro se ocorrerá.
Ao indicar a chapa completa, a Marfrig deixa definitivamente a postura de acionista passiva que anunciou em maio do ano passado, quando montou a posição na BRF. Numa entrevista ao Pipeline na ocasião, Molina fez questão de dizer que não faria qualquer movimento para afastar a gestão ou derrubar o conselho de administração.
Com o vencimento do mandato no board, a Marfrig inevitavelmente avaliaria com o que poderia agregar, indicou o empresário em maio do ano passado. “Não entramos em uma companhia que é um problema. A BRF avançou muito em governança nos últimos tempos. E a verdade é a seguinte: a BRF fez um excelente ano em 2020. Em abril, a Marfrig vai avaliar se tem alguém para agregar [no conselho] ou não”. Quase um ano depois, parece ter encontrado dez nomes para agregar.