O professor de Agronegócio Global do Insper, Marcos Jank, avalia que a China deve adotar a agenda europeia de proibir importação de commodities ligadas a desmatamento. “A sustentabilidade vai entrar fortemente na agricultura chinesa. Acreditamos que irão comprar a agenda europeia de proibir desmatamento importado. A China já fez isso na sanidade, adotando regras europeias e acredito que vão incorporar essas restrições de uso da terra”, disse Jank, durante evento do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) realizado, virtualmente, ontem (14).
Na avaliação de Jank, a mudança da agenda chinesa deve atingir a soja e a pecuária de corte do Brasil. “No caso da soja, afeta particularmente produção no Cerrado, porque na Amazônia há a moratória e no Cerrado há expansão da soja com desmatamento. Na pecuária de corte, o tema é ainda mais complicado porque trata-se da principal atividade agrícola presente no bioma Amazônia”, observou Jank.
Para ele, a adoção de uma agenda sustentável na China exige que o Brasil melhore a relação com o país asiático, que é o maior parceiro comercial, e adote postura de diálogo. “Precisamos explicar a realidade brasileira, tanto o lado vilão como o lado solução”, afirmou Jank. Ele citou como “lado vilão” o desmatamento ilegal e o lado solução a adoção da agricultura de baixo carbono, de plantio direto e de projetos de integração lavoura-pecuária-floresta. “O diálogo entre Brasil e China será mais importante do que nunca. Precisamos mostrar o que estamos fazendo em sanidade, meio ambiente para eliminar o desmatamento ilegal e para expandir a agricultura sobre pastagens”, apontou. “O Brasil precisa ampliar o diálogo e fazer a lição de casa no combate ao desmatamento ilegal”, acrescentou.
Sobre o desmatamento ilegal que ocorre no País, Jank defendeu o combate e a transparência do País nas medidas adotadas. “Desmatamento ilegal é um problema do Brasil. Não é problema da China, dos Estados Unidos e nem da Europa. É um problema de implantação do Código Florestal, de regularização fundiária e de falta de fiscalização na Amazônia que precisa ser combatido”, argumentou.
Jank também afirmou que o Brasil tem enorme potencial agroambiental e que é um dos países que mais pode conciliar expansão agrícola e conservação ambiental. “Não precisamos ampliar agricultura sobre áreas de florestas. Agricultura será ampliada sobre pastagens”, pontuou. Segundo ele, o País possui 80 milhões de hectares de terras agrícolas e mais de 160 milhões de hectares de pastos – destes 50 milhões podem ser convertidos para agricultura. “Neste ano, três milhões de hectares foram convertidos de pastos para agricultura”, comentou.
Autossuficiência – Mesmo que estabeleça a autossuficiência “controlada” como prioridade, a China não vai deixar de olhar para o mercado internacional e importar sempre que necessário, avalia o professor de Agronegócio Global do Insper, Marcos Jank. “Foi isso que abriu oportunidades para soja, celulose, algodão e mais recentemente para as carnes brasileiras. Mas ainda assim, a China quer ser autossuficiente”, disse. Em carnes, o país almeja a autossuficiência em suínos e aves, segundo ele.
Além da autossuficiência, Jank destacou que a China está incluindo o componente ambiental dentro da sua política agrícola, somando exigência em sanidade e segurança do alimento. “Há poucos anos, a China começou a olhar a sustentabilidade dentro da agricultura. O uso da terra e as tecnologias de baixo carbono entram na pauta da agricultura chinesa”, disse Jank.
Rastreabilidade – A rastreabilidade da cadeia bovina, principalmente no monitoramento dos fornecedores, precisa ser estendida para pequenas e médias empresas, avalia o professor de Agronegócio Global do Insper, Marcos Jank. “Nos últimos anos, todas grandes empresas adotaram mecanismos para controlar a cadeia de suprimento. Elas estão fazendo o possível para o controle e estão conseguindo. Mas o fato de as grandes empresas estarem fazendo não significa que todo o setor está se mexendo. O movimento precisa também ser das pequenas e médias empresas”, disse Jank. “Estender o movimento (para frigoríficos de menor porte) é um desafio muito grande e que me preocupa”, apontou.
Na avaliação de Jank, a rastreabilidade é um dos maiores desafios da pecuária brasileira. “O rastreamento é um desafio muito grande no caso do boi porque na Amazônia a pecuária é a primeira atividade de ocupação de áreas desmatadas ilegalmente. Para fixar a posse, são colocados bois e vacas nessas áreas”, comentou. Ele esclareceu, contudo, que a pecuária de corte não é a causa do desmatamento. “A causa é a madeira e a exploração imobiliária. Boi é utilizado como fixação de posse da área porque o governo estimulou por muitos anos o avanço da pecuária para Cerrado e Amazônia”, disse. Além deste ponto, ele acrescentou que outra dificuldade do setor é o rastreamento indireto, ou seja, a garantia de que bois comprados terminados não foram criados em áreas desmatadas. “A rastreabilidade será fator obrigatório. Consumidores pedem rastreamento e geomonitoramento de seus produtos”, pontuou.
Outra situação que o setor terá de enfrentar, conforme Jank, é a redução das emissões de carbono. “Mensurar as emissões não somente das empresas, mas também dos fornecedores exige tecnologias como intensificação das pastagens, diminuição dos processos de fermentação e controle dos dejetos”, apontou.