Por Marcos Jank/Insper
A China “passou uma régua”, ou seja, reduziu bastante a suinocultura de subsistência no País, após a forte crise de peste suína africana (PSA), que dizimou pelo menos metade do seu plantel a partir de 2018. Segundo o professor sênior do Insper Marcos Jank, a porcentagem de suinocultores que detêm menos de 50 cabeças de suínos na China caiu de 25% do total em 2015 para apenas 4% em 2021. Jank participou, ontem (5), do 4º Seminário StoneX – Desafios e Oportunidades para os Mercados de Commodities, promovido pela consultoria. Já o total de produtores com mais de 3 mil cabeças de suínos alojadas, ou seja, produção em larga escala, representa hoje 31% do plantel e, por fim, a produção chamada “especializada”, com cerca de 30 mil animais por produtor, representa 65%.
Diante dessa especialização da suinocultura chinesa, Jank lembrou que o país asiático precisará cada vez mais importar grãos, sobretudo milho. “E, neste cenário, o Brasil poderá contribuir bastante, já que se tornou um grande player global, desde 2012, também no mercado do milho.”
‘Caneladas’ – O professor sênior do Insper Marcos Jank disse ficar preocupado quando vê “algumas lideranças brasileiras dando caneladas na China”. Segundo ele, “não deveríamos fazer isso com os nossos maiores clientes; a China é nosso principal cliente e precisa ser cultivada”. Para ele, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, trabalha bem neste sentido, mas, “infelizmente, o governo brasileiro ataca a China, e isso não é bom”.
Segundo o professor do Insper Agro Global, o que o País deveria fazer é aproveitar a atual conjuntura chinesa, que ainda enfrenta consequências da peste suína africana, e se mantém numa “briga hegemônica com os Estados Unidos, que ainda vai longe”, para “solidificar a relação” com o gigante asiático. Ele lembrou, sob este aspecto, que a China produz 90% das carnes que consome e importa apenas 10%, mas que há espaço para crescer, embora haja dificuldades impostas cada vez que o Brasil tenta liberar a importação de produtos mais acabados, como papel (em vez de celulose) ou farelo de soja (em vez do grão). “Exportamos commodities agrícolas. Quando adicionamos valor ao produto, vai ficando difícil, há mais restrições, mas é do nosso interesse exportar mais carnes, por exemplo.”
Ao mesmo tempo, Jank lembrou que o agronegócio brasileiro, juntamente com o governo, deve trabalhar os mercados do Sul e Sudeste da Ásia, Oriente Médio e África, que são o futuro das vendas externas do setor. “Em termos de demanda, não temos problema; hoje temos a China e amanhã teremos, certamente, Sul da Ásia, principalmente Índia, e África, que terão um crescimento populacional extraordinário, além de aumento de renda per capita.” Jank disse, por isso, que é “para lá que o Brasil deve construir relacionamentos e pontes”, comentou. “Este é o nosso futuro, o nosso porto, e nosso destino para os próximos anos. É lá que temos de estar presentes e construir relacionamentos.”
Para o professor do Insper, certamente o Brasil será um dos principais fornecedores de alimentos para essas regiões, inclusive porque, internacionalmente, há poucos players atuando no mercado global de alimentos. “São nove ou dez, como Estados Unidos, Austrália, os países do Mercosul e Tailândia, e os que mais têm crescido em exportação no mundo são os países americanos, como Estados Unidos e Canadá e os do Mercosul.”
Todo este potencial, entretanto, não exclui a necessidade de o Brasil trabalhar para ter mais acessos a mercados. “Temos de fazer um esforço maior neste sentido”, disse. “Se há algum setor em que o Brasil tem poder de mercado, certamente é o da agricultura.”