A elevação da Selic em 1% encarece o crédito rural no Brasil, sobretudo no momento crítico de pré-safra, quando os produtores demandam capital para custeio e investimentos. Isso afeta principalmente os pequenos e médios produtores, menos capitalizados.
Por outro lado, a manutenção dos juros nos EUA tende a manter o dólar forte, o que, normalmente, poderia beneficiar as exportações brasileiras. No entanto, como a Selic subiu, parte dessa vantagem cambial pode ser neutralizada, já que há mais entrada de capital estrangeiro no Brasil, valorizando o real.
Segundo o economista e CEO da Oz Câmbio, Rodrigo Xavier, explica com exclusividade para a MundoAgro, para a produção de grãos, há impacto direto no custo de financiamento e na compra de insumos importados (como fertilizantes). A rentabilidade pode ser comprimida. “E para proteína animal, o impacto se dá em duas frentes: custo dos grãos (milho e soja) usados como ração pode subir, pressionando as margens dos produtores”, explica.
Ele aponta que o financiamento para manejo, confinamento e renovação de equipamentos, assim, fica mais caro. “As consequências para os produtores com crédito caro e insumos ainda pressionados, como crédito mais caro e insumos ainda em alta, os custos de produção seguem elevados. Isso pode levar a redução na área plantada ou no número de cabeças confinadas, por contenção de custos; busca por tecnologias de precisão e alternativas de nutrição animal para mitigar impactos; maior seletividade na escolha de insumos e fornecedores. Além disso, com o produtor mais cauteloso, a tendência é de negociações mais tardias de compra e venda, o que gera incerteza no planejamento da safra e compromete a previsibilidade dos mercados”, diz.
Queda do dólar: boa ou ruim para o agro?
A queda do dólar tem efeito duplo no agronegócio. “Para exportações é negativa, porque reduz a competitividade do produto brasileiro no exterior e diminui a margem de lucro dos exportadores. A receita em reais fica menor. Para insumos importados (como fertilizantes, ureia, defensivos) é positiva, pois reduz o custo de aquisição, aliviando um pouco a pressão sobre o produtor”, explica Rodrigo Xavier. “Dólar alto é bom para quem exporta, ruim para comprar insumos. Dólar baixo gera alívio nos custos, mas piora na receita externa. O ideal seria um câmbio equilibrado, que permita boas margens de exportação sem penalizar demais a aquisição de insumos”, explica Xavier.
Tarifas de Trump e tensões com o agro brasileiro
Até agora, nenhuma tarifa do governo Trump impactou diretamente o agro brasileiro. No entanto, o setor acompanha com atenção o risco de barreiras sanitárias ou fitossanitárias disfarçadas de medidas técnicas, reações protecionistas em setores onde o Brasil tem forte presença (como carne bovina, soja ou etanol); pressões políticas em acordos comerciais multilaterais.
“O mercado vê com cautela, porque o perfil de Trump tende ao nacionalismo econômico. O Brasil, como grande exportador agro, pode ser afetado por retaliações cruzadas entre EUA e China, ou por medidas de estímulo à produção interna americana”, afirma o economista.
Cadeias produtivas em maior risco e equilíbrio no setor de proteína animal:
Cadeias mais vulneráveis:
– Frango e ovos, por dependerem fortemente de ração à base de milho e soja — qualquer oscilação no preço desses grãos afeta diretamente os custos.
– Carne suína, por questões sanitárias (como peste suína africana em países parceiros) e alta sensibilidade ao mercado externo.
– Carne bovina, apesar de ter demanda sólida, pode sofrer com barreiras comerciais ou flutuação cambial.
Como se equilibrar?
“Para se buscar equilíbrio econômico é importante diversificar mercados de exportação (para diluir riscos geopolíticos); investir em eficiência produtiva (tecnologia, genética, nutrição); ajustar a produção conforme os sinais de mercado (modular confinamento, por exemplo); aproveitar períodos de dólar alto para travar contratos futuros de exportação”.
Walter Belik, um dos fundadores do Instituto Fome Zero e Professor Titular de Economia Agrícola do Instituto de Economia da Unicamp, explica também com exclusividade para a MundoAgro, que com relação à taxa de juros o que deve acontecer é que com esta, mais elevada do Brasil, vai atrair capital atraindo capital. “O câmbio se valoriza o real se valoriza em relação ao dólar ou seja as exportações vão ser remuneradas com valores menores do que anteriormente. isso pode ser um desestímulo à exportação, isso pode ser também um estímulo a que se comercialize esses produtos internamente”, aponta. “O fato da taxa de juros está paralisada nos Estados Unidos, por enquanto, não quer dizer nada, porque efetivamente está se prevendo uma inflação norte-americana para os próximos meses, e o Fed já sinalizou que pode aumentar essa taxa de juros, o que vai ser bastante complicado também para a economia americana, porque a gente pode ter um cenário de inflação com recessão, com redução. Já está tendo dois trimestres praticamente em queda do PIB e isso pode se configurar uma recessão com uma taxa de juros mais elevada”, explica Belik.
Com relação à compra de insumos, ele afirma que o Brasil vai continuar com grandes pressões. “Nós ainda temos uma dependência muito grande com relação a fertilizantes. Embora o Brasil seja um grande produtor de petróleo, sendo um grande exportador de petróleo, a produção interna de fertilizantes é inferior à demanda. Então nós ainda importamos bastante e temos aí pressões internacionais bastante sérias. Muito provavelmente a guerra na Ucrânia vai continuar, o preço do petróleo deve continuar bastante elevado, embora os Estados Unidos aumentem a oferta. Então, como consequência, os brasileiros vão pagar mais caro por esses insumos. Isso não tem uma relação direta com a taxa de juros nos Estados Unidos, mas vai afetar bastante a rentabilidade da produção brasileira”, diz Belik.
Quanto mais alto o dólar, melhor para os produtores, mas por outro lado, é bom para a parte dos insumos, como adubação e ureia?
“Esse é um fator positivo não só em termos correntes, em compra e venda para o mercado interno, mas também em relação a uma sinalização futura com relação aos preços que vão ser praticados aqui. O governo está bastante preocupado com a inflação dos alimentos, e isso daí pode representar um alento futuro. É lógico que, do ponto de vista dos produtores, aqueles que exportam principalmente, que efetivamente vão realizar essa produção em dólar, isso pode não ser tão positivo, mas o mercado interno está bastante aquecido.
Então, é bastante viável você redirecionar essa produção que iria para a exportação para o mercado interno, que está demandando cada vez mais, embora a gente ainda não tenha desabastecimento. Em alguns produtos, o fato do mercado interno estar demandando bastante fez com que algumas importações acabassem encarecendo o produto. Esse é o caso do arroz. E nesse ano nós vamos ter uma safra recorde de arroz, a Conab está prevendo um crescimento de 14,3% nessa safra, para 12 milhões de toneladas, e isso reduz a importação, ou elimina praticamente a importação. Também temos uma boa perspectiva em relação ao trigo que é importado. Nós vamos importar menos trigo esse ano, Então do ponto de vista do mercado interno vai ser positivo esse movimento”.
Com relação às tarifas que o Trump pretende impor às exportações brasileiras ainda é incerto, segundo ele, porque ainda não foi nada concretizado em relação a isso, não há uma tarifa geral, como está tentando se impor aos chineses, por exemplo, as tarifas são setoriais ainda, mas certamente para alguns produtos agrícolas nós vamos ter algum problema para a colocação dos produtos no mercado norte-americano. “Por exemplo, o Canadá é um grande exportador de carne para os Estados Unidos e agora com uma tarifa de 30% na exportação do produto, não vai ser possível que a carne brasileira entre no mercado norte-americano com uma tarifa baixa, embora tenha tarifas competitivas. Por outro lado, o que acontece é que o Brasil vai conseguir substituir algumas exportações americanas, porque vai ter retaliação. Certamente os europeus vão retalhar, certamente a China vai retalhar. A China é um grande comprador de produtos agrícolas norte-americanos e o Brasil tem condições de ampliar as suas exportações para esses mercados, para a China e para a Europa. Então, pode ser que a gente reduza a exportação para os Estados Unidos, o que, de certa forma, pode ser bom, porque reduz a nossa vulnerabilidade em relação a essas exportações e nos abre novos mercados para carnes, principalmente, e outras commodities que o Brasil tem grandes vantagens competitivas”, explica Walter Belik.